CIDADES PELA PAZ

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Como transformar uma cidade tomada pela violência em um lugar onde as pessoas podem ocupar os espaços urbanos sem medo?

Como transformar um lugar ocupado por um lixão em um projeto social que vem resgatando o orgulho e a autoestima de seus moradores?

Que modelo é esse, que transforma medo em esperança, que transforma lixo em orgulho? Que caminhos estas três cidades escolheram para vencer os desafios da inclusão social?

Esperança, foi com esse sentimento que eu saí do encontro que reuniu essas três grandes cidades latino-americanas: Medellín (Colômbia), Iztapalapa (México) e Recife (Brasil). Cidades que compartilham problemas em comum e projetos inovadores que estão mudando o desenho social destes centros urbanos. Nessa matéria você vai conhecer o projeto UTOPIAS da cidade de Iztapalapa no México, vai conhecer as ações que vêm sendo implantadas em Medellín na Colômbia que fizeram dessa cidade um exemplo de sucesso para o mundo, vai conhecer também o projeto COMPAZ da cidade do Recife, verdadeiras Fábricas de Cidadania que vem ganhando o jogo contra a violência urbana com muita cultura, esporte, inclusão social e empreendedorismo.

Vamos começar falando sobre o projeto UTOPIAS da cidade de Iztapalapa no México, nesse encontro, eu tive o prazer de ouvir uma palestra da prefeita da cidade Clara Brugada. Clara é uma entusiasta, cuja vontade de realizar não enxerga barreiras, ela foi aplaudida de pé pelo público ao final da sua participação no evento. Não era para menos, ela mostrou o que se pode fazer por uma cidade quando se tem disposição e uma ideia clara em mente. E não foi pouco o que Clara precisou enfrentar para fazer do projeto UTOPIAS o que é hoje. Foi preciso vencer o medo, a desconfiança, o preconceito e a falta de recursos para fazer do projeto UTOPIAS uma realidade.

Orgulho é marca registrada das pessoas que vivem hoje na cidade de Iztapalapa, um lugar que antes era o lixão da Cidade do México, onde as pessoas viviam em meio a violência, ao lixo, sem perspectiva e sem esperança. Resgatar a dignidade destas pessoas foi a maior vitória desse projeto, fazer com que o lugar onde as pessoas vivem seja motivo de orgulho e não de vergonha depois de anos de preconceito, exclusão e rejeição social não foi uma tarefa fácil, foi preciso ter muita convicção naquilo que se está fazendo para não desistir, e foi isso, que Clara Brugada e sua equipe fizeram, não desistiram, eles seguiram em frente acreditando na sua UTOPIA.

Orgulho é marca registrada das pessoas que vivem hoje na cidade de Iztapalapa, um lugar que antes era o lixão da Cidade do México

Com mais de dois milhões de habitantes Iztapalapa é um dos subúrbios urbanos mais populosos da américa latina, e os seus problemas eram tão grandes quanto a sua população. Um lugar que era sinônimo de violência e abandono do poder público hoje se transformou em uma referência mundial em projetos de cidadania e inclusão social. A utopia virou realidade e fez desta cidade um lugar diferente, um lugar amigo das pessoas, um lugar bom de se viver.

A mudança foi imensa, hoje Iztapalapa é uma referência em inclusão social. O Projeto Utopias obteve grandes conquistas sociais para os seus moradores. Iztapalapa conta hoje com a maior linha de teleférico urbano das américas, possui mais de 7.000 murais nas paredes de suas ruas feitos por artistas locais e tem as ruas mais iluminadas do país, tudo isso para fazer da cidade um lugar mais seguro, mais acolhedor e com mais oportunidades de convívio para as pessoas.

Com mais de dois milhões de habitantes Iztapalapa é um dos subúrbios urbanos mais populosos da américa latina

As Utopias são espaços culturais e recreativos do tamanho de um shopping center, onde milhares de jovens vêm todos os dias para aprender teatro, fotografia, música, arte urbana, boxe, atletismo e natação. As Utopias possuem modernos auditórios, pistas de atletismo, uma rede de atendimento para mulheres, lagos artificiais, pistas de skate e até pistas de patinação no gelo. Além de tudo isso, Iztapalapa conta com 12 piscinas públicas, sendo uma delas olímpica. Iztapalapa investiu também em segurança pública, quadruplicou o número de patrulhas nas ruas de 172 para 564, dobrou o número de policiais para cada 10.000 habitantes e aumentou de 3.000 para 9.000 as câmeras de vigilância.

Isso tudo nasceu de um sonho, uma utopia de um governo que decidiu fazer escolhas diferentes, que decidiu agir em benefício do cidadão, que decidiu olhar para as pessoas com um olhar mais humano, mais próximo, mais inclusivo. Um olhar mais acolhedor. Governos assim, mudam a realidade das pessoas, pessoas como Clara Brugada estão no poder para fazer o bem. Da cidade de Iztapalapa no México onde as Utopias viram realidade, vamos embarcar para a cidade de Medellín na Colômbia para conhecer a história de outro sonhador que aprendeu como transformar sonhos em realidade.

Isso tudo nasceu de um sonho, uma utopia de um governo que decidiu fazer escolhas diferentes, que decidiu agir em benefício do cidadão

O nome dele é Jorge Melguizo, ele foi Secretário da Cultura Cidadã e de Desenvolvimento Social de Medellín, cidade da Colômbia que entre os anos de 2005 e 2010 figurava entre as cidades mais violentas do mundo.  A cidade, antes conhecida por ser o quartel general do violento Cartel de Medellín, rede de traficantes de drogas comandada por Pablo Escobar, que operou na Colômbia, Bolívia, Peru, Honduras, Estados Unidos, Canadá, Brasil e na Europa entre anos de 1972 e 1993. Eram esses os inimigos que pessoas como Jorge Melguizo e sua equipe precisaram enfrentar para fazer de Medellín uma cidade referência em segurança, cidadania e inclusão social.

Os atentados a bomba eram comuns em Medellín, as pessoas vivam em um clima de terror permanente, os senhores do tráfico mandavam na cidade, o medo e o silêncio imperavam nas ruas de Medellín. Era esse o clima da cidade quando Jorge Melguizo e sua equipe assumiram a dura tarefa de transformar essa realidade. Dinheiro não era problema, pois vários países tinham interesse no fim do Cartel de Medellín, a cidade tinha a seu favor a opinião pública e os financiamentos de organismos internacionais que estavam dispostos a investir para dar um fim a toda essa violência.

Os atentados a bomba eram comuns em Medellín, as pessoas vivam em um clima de terror permanente, os senhores do tráfico mandavam na cidade

O que faltava eram pessoas locais com coragem, dispostas a arriscar a própria vida e a vida de suas famílias para mudar essa realidade. Foi isso que Jorge e sua equipe fizeram, assumiram um compromisso pessoal de fazer de Medellín um lugar melhor para se viver. A mudança veio através da cultura e da educação, o número de homicídios que era de 382 casos para 100 mil habitantes nos anos 1990, baixou para 39 casos no último ano da gestão de Jorge Melguizo. O investimento em cultura que representava apenas 0,68% do orçamento municipal passou representar 5 % de toda arrecadação da cidade, as verbas para educação subiram de 12% para 40% do orçamento. A mudança de Medellín prova que a educação e a cultura são as melhores ferramentas de governo para vencer a violência.

Jorge sempre fala que a transformação começa com essas quatro palavras: conhecer, reconhecer, valorizar e potencializar. Ele diz que é preciso fazer as perguntas certas para que possamos conhecer as pessoas e a cidade em que vivemos, fala que precisamos reconhecer as diferenças e os abismos culturais e sociais que existem entre as pessoas mais favorecidas e aquelas que vivem nas periferias à margem das oportunidades. Jorge deixa claro que precisamos valorizar o que as pessoas têm de melhor em suas comunidades e ajudá-las a fortalecer a sua própria identidade cultural como cidadãos.

A mudança de Medellín prova que a educação e a cultura são as melhores ferramentas de governo para vencer a violência

Valorizar é dar oportunidade, é retirar do caminho destas pessoas as barreiras, é construir um espaço social onde a cultura da comunidade possa ser fortalecida e multiplicada em cada canto da cidade. É potencializar as coisas boas e eliminar as coisas ruins que teimam em favorecer a violência em detrimento da paz, o isolamento em detrimento da inclusão social e a degradação das cidades em detrimento da transformação dos nossos centros urbanos.

Durante a gestão de Jorge Melguizo, uma frase era muito ouvida na prefeitura de Medellín “temos que abrir a porta das oportunidades para que possamos fechar as portas da violência e da criminalidade”. Gerar oportunidades educativas, culturais, de recreação, de esporte, ampliar a consciência política das pessoas, ajudá-las a ter a sua voz ouvida e fazê-las sentir que são cidadãos e uma parte ativa da sociedade, foi fundamental, para que a mudança de Medellín tivesse sucesso e pudesse acontecer. De Medellín na Colômbia, seguimos para a cidade do Recife no nordeste do Brasil, lá iremos conhecer mais um sonhador que aprendeu a mudar cidades e a transformar a vida das pessoas através da cidadania.

” Temos que abrir a porta das oportunidades para que possamos fechar as portas da violência e da criminalidade “

Murilo Cavalcanti é o nome dele, ele é o atual secretário de Segurança Cidadã da Prefeitura da Cidade do Recife, foi pelo seu coração e não apenas pela sua cabeça, que surgiu o conceito que vem mudando a realidade dos bairros mais carentes do Recife. Especialista em Políticas Públicas de Prevenção à Violência, Murilo foi o responsável pela concepção dos Centros Comunitários da Paz, os COMPAZ, equipamentos públicos voltados para a promoção da cidadania, educação, cultura da paz e não violência.

Nos últimos 15 anos, Murilo visitou 34 vezes as cidades de Bogotá e Medellín, na Colômbia, o que resultou no livro “As Lições de Bogotá e Medellín – Do Caos à Referência Mundial”. Ele é um defensor incansável do papel das transformações urbanas para promoção da cidadania e para reversão da violência nas grandes cidades. Durante o encontro destas três cidades Medellín (Colômbia), Iztapalapa (México) e Recife (Brasil) tivemos o lançamento do seu livro mais recente: “Conexão Recife-Medellín Compaz” que conta a história desta iniciativa vencedora.

Conhecidos como as Fábricas de Cidadania do Recife, os Centros Comunitários da Paz – COMPAZ se destacam tanto pela sua estrutura quanto pelos serviços prestados as comunidades. As unidades contam com piscinas, quadras poliesportivas, espaço para artes marciais, pista de skate, bibliotecas com acesso à internet, estúdios de rádio e TV, cursos de robótica, animação digital e cultura maker, além de auditórios e cineteatros onde são oferecidas aulas de balé, dança popular, fotografia, teatro e gestão cultural. Os espaços do projeto COMPAZ tem como principal objetivo resgatar o sentimento de pertencimento das pessoas pela sua cidade, transformando meros moradores em verdadeiros cidadãos.

O fato é esse, violência não se combate apenas com mais segurança, violência se combate com inclusão social, com mais cultura e com educação

Em todas essas três cidades Medellín (Colômbia), Iztapalapa (México) e Recife (Brasil) o caminho encontrado para a paz passou pela mobilização social, pelo resgate da autoestima das pessoas, pela valorização dos espaços urbanos comunitários como vetores de atração e retenção das pessoas que vivem nessas comunidades. O fato é esse, violência não se combate apenas com mais segurança, violência se combate com inclusão social, com mais cultura e com educação. Fica a dica para quem quiser mudar a vida na sua cidade, a paz se conquista com cidadania, se você ainda tem alguma dúvida disso, é só perguntar para o Jorge, para a Clara ou para o Murilo.

 

Autor: Prof. Jorge Menezes é palestrante, jornalista, escritor, colunista nas áreas de empreendedorismo e negócios. CEO da Radar Executivo Business School, Head of Content da Revista Radar Executivo, Apresentador do Canal Radar Executivo no YouTube e do Podcast Radar Executivo no Spotify. É autor de vários best-sellers: Aprenda a Negociar com os Tubarões® (2013)Transformando Networking em Negócios® (2015) e O Código Secreto da Venda® (2020) todos publicados pela Editora Alta Books.

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